domingo, 8 de março de 2015

Menos Dia!


O cansaço do dia não lhe permitia parar: “imagina, dar-se a tal luxo”. Seu nome? Mais de que haverá de importar, já que documento também não lhe faria de nenhuma serventia. Era na cana que labutava, e dela tirava o pouco que tinha de comer.

Era o rapaz mais velho que já avistei por essas bandas. Estava tudinho ali, estampado nos olhos e na cara de manchas vindas da luz que alumia – mas não poderia parar, tal era o cansaço daquele malfadado dia.

Para a esposa, que havia de ser bonita por demais – se não fosse os trapos que a cobria, bem como o cheiro de gordura da sardinha que fritara para o seu homem levar no vermelho anil do céu que já anunciava o Menos um dia.

O amigo tente me entender, que não é loucura minha. Pois se era o próprio Velho-rapaz que sempre respondia ao meu comprimento assim: “Menos dia, sinhô!” e até que ele tinha lá seus motivos.

Numa dessas tardes, com um sol que ardia de lascar, mas com aquela brisa mansinha que faz a gente troca a sesta pelo tereré de baixo d´árvore só p fica olhando as moças que passam com o babado do vestido balangando e balangando, que é para modo de a gente esquecer as mazelas dessa vida e agradecer a Deus, Jesus e Nossa Senhora! Pois bem, numa dessas tardes ele passou e como de costume eu disse:

Dia!

Menos dia sinhô!

Diabo! Pois espere rapaz… porque é que haveria de ser menos se sol tá é no topo? Se você me falasse: “meio dia” até que daria para compreender. Mas … menos? Porque diacho que ocê diz isso?

Não carece pasmar não sinhô, pois para mim é Menos dia desde a hora que levanto para labutar até a hora que deito com minha Luzia.

Mas porque disso, homem de Deus?

Ora, mais o sinhô num sabe não? É que cada dia que começa é menos um dia pra modo de eu e minha Luzia tá junto de Nossa Senhora e finalmente podê tem algum descanso e regalo nessa vida.

 Olhe, o amigo há de entender que depois dessa prosa já não tinha como argumentar. Só restou mesmo foi perceber que o moço até que tinha o seu punhado de razão. Mas o que é que eu estava mesmo lhe dizendo? Ah…Sim. Bem… é que para a pobre da esposa não sobrava muito do corpo cansado do marido. A não ser, uma certa vez, logo de comecinho, se é que o amigo me entende? Mas essa foi é certeira, logo de primeira ele já fez um filho na dona Luzia, é pena que nem essa felicidade ela teve.

Isso porque não tinha muita informações bandas, muito menos internet, nem aqueles cartazes coloridos o governo mandava para o postinho daqui. Pois então, dizem que era um menino, desses que já cresce montando em cavalo, nasce pra ser ponteiro e ajudar a gente na lida. O problema é que veio a maldita febre, aquela do pernilongo rajado, aquele manchado de branco – e o moleque não aguento.

Bom… e foi ai que a dona Luzia e seu esposo começaram a contar o Menos dia.