O
cansaço do dia não lhe permitia parar: “imagina, dar-se a tal
luxo”. Seu nome? Mais de que haverá de importar, já que documento
também não lhe faria de nenhuma serventia. Era na cana que
labutava, e dela tirava o pouco que tinha de comer.
Era
o rapaz mais velho que já avistei por essas bandas. Estava tudinho
ali, estampado nos olhos e na cara de manchas vindas da luz que
alumia – mas não poderia parar, tal era o cansaço daquele
malfadado dia.
Para
a esposa, que havia de ser bonita por demais – se não fosse os
trapos que a cobria, bem como o cheiro de gordura da sardinha que
fritara para o seu homem levar no vermelho anil do céu que já
anunciava o Menos um dia.
O
amigo tente me entender, que não é loucura minha. Pois se era o
próprio Velho-rapaz que sempre respondia ao meu comprimento assim:
“Menos dia, sinhô!” e até que ele tinha lá seus motivos.
Numa
dessas tardes, com um sol que ardia de lascar, mas com aquela brisa
mansinha que faz a gente troca a sesta pelo tereré de baixo d´árvore
só p fica olhando as moças que passam com o babado do vestido
balangando e balangando, que é para modo de a gente esquecer as
mazelas dessa vida e agradecer a Deus, Jesus e Nossa Senhora! Pois
bem, numa dessas tardes ele passou e como de costume eu disse:
—Dia!
—Menos
dia sinhô!
—Diabo!
Pois espere rapaz… porque é que haveria de ser menos se sol tá é
no topo? Se você me falasse: “meio dia” até que daria para
compreender. Mas … menos? Porque diacho que ocê diz isso?
—Não
carece pasmar não sinhô, pois para mim é Menos dia desde a hora
que levanto para labutar até a hora que deito com minha Luzia.
—Mas
porque disso, homem de Deus?
—Ora,
mais o sinhô num sabe não? É que cada dia que começa é menos um
dia pra modo de eu e minha Luzia tá junto de Nossa Senhora e
finalmente podê tem algum descanso e regalo nessa vida.
Olhe,
o amigo há de entender que depois dessa prosa já não tinha como
argumentar. Só restou mesmo foi perceber que o moço até que tinha
o seu punhado de razão. Mas o que é que eu estava mesmo lhe
dizendo? Ah…Sim. Bem… é que para a pobre da esposa não sobrava
muito do corpo cansado do marido. A não ser, uma certa vez, logo de
comecinho, se é que o amigo me entende? Mas essa foi é certeira,
logo de primeira ele já fez um filho na dona Luzia, é pena que nem
essa felicidade ela teve.
Isso
porque não tinha muita informações bandas, muito menos internet,
nem aqueles cartazes coloridos o governo mandava para o postinho
daqui. Pois então, dizem que era um menino, desses que já cresce
montando em cavalo, nasce pra ser ponteiro e ajudar a gente na lida.
O problema é que veio a maldita febre, aquela do pernilongo rajado,
aquele manchado de branco – e o moleque não aguento.
Bom…
e foi ai que a dona Luzia e seu esposo começaram a contar o Menos
dia.